sexta-feira, 25 de dezembro de 2009


Solidão…profunda solidão
Dar ao gatilho
Apressar…apressar este rastilho
Milagre sem perdão

Pesa-me a mente,
Constante derrube
Esta urbe…
Decadente

Dar ao gatilho
Apressar…apressar este rastilho!

sábado, 12 de dezembro de 2009


Perdido…de olhar no chão,
Procuro na pedra o teu coração,
Perco-me em mil devaneios…
Pesam-me tanto os meus anseios,
Queria ser outro que não eu,
Que nada o amor me deu,
E se deu…deu-me esta cruz,
Ando cego…sem a tua luz…
Caminho tão só…
Como vento incerto em noite escura,
E como dura…a solidão que me perfura,
Triste, amarga, digna de dó…
Raios e trovões por companhia,
Assim eu ando…noite e dia,
Vivo inquieto numa só estação,
Mudam-se os anos…a chuva é que não!

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009


Quando eu Morrer
Não digam que morri
Digam que viajei ou simplesmente parti
Mas não digam que morri!

É que talvez assim eu permaneça
No suspenso de um Quase,
E que da tortura eu me enlouqueça!

Quando eu morrer
Não digam que morri
Digam apenas que me sorvi
Até à ultima golada
E que me lambuzei
Na irascibilidade do meu Ser!
Ah... e que bravura
Que cobardemente me enclausura...

Quando eu morrer
Não digam que morri
Digam antes que por fim espaireci

Mas peço-Vos... Não digam que morri!






terça-feira, 1 de dezembro de 2009


Tenho dificuldades em justificar
A minha existência
A única palavra que me ocorre
É "Incoerência"!
Tantas vezes tenho sido coveiro
De almas moribundas
Eu, sem tratamento
Opróbrias horas vagabundas…

Que inveja tenho eu dos palermas,
Dos estultos e dos dementes,
Que inveja tenho eu dos crentes…

A lamina composta de aço repetido
É o meu ser!
Repetido, martelado, reinventado
Aquecido, cinzelado, temperado
A ruborescer…

Desvaneço-me no meu todo
A minha Quinta-Essência chama-se Lodo!

Suspenso…
É isto que de mim penso!
Um eterno quase perfeito
Que se move a contra-feito,
Anzol enferrujado em mar desfeito…

Escuro, inerte… Perscrutando o Breu
Sob a égide gloriosa de um vil Orfeu


Este,
Do mais alto píncaro incoerente em que se meteu…
Sou Eu, …
E tão apenas eu…

domingo, 29 de novembro de 2009


No plaino abandonado
Que a morna brisa aquece,
De balas trespassado
-Duas, de lado a lado-,
Jaz morto, e arrefece.

Raia-lhe a farda o sangue.
De braços estendidos,
Alvo, louro, exangue,
Fita com olhar langue
E cego os céus perdidos.

Tão jovem! Que jovem era!
(agora que idade tem?)
Filho unico, a mãe lhe dera
Um nome e o mantivera:
«O menino de sua mãe.»

Caiu-lhe da algibeira
A cigarreira breve.
Dera-lhe a mãe. Está inteira
E boa a cigarreira.
Ele é que já não serve.

De outra algibeira, alada
Ponta a roçar o solo,
A brancura embainhada
De um lenço… deu-lho a criada
Velha que o trouxe ao colo.

Lá longe, em casa, há a prece:
“Que volte cedo, e bem!”
(Malhas que o Império tece!)
Jaz morto e apodrece
O menino da sua mãe


Fernando Pessoa

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Vinho de Mesa


Fui por aí cambaleando
Bebendo esta água de beber
Escorregando na calçada infecta
Fui por aí vagueando
Liquefiz-me em porta certa
Rota a vida, imundo ser

Mas é preciso continuar
De porta em porta
Como um outro que penetra
E nem sempre acerta!
Que fazer?
-Pardonez moi, foi só um copo a mais
Ou talvez descurando os sinais
Um copo a menos para os meus ais!

Aqui hoje não janto,
Nem espaireço o meu pranto,
Talvez ali, na meia desgastada
Porei o meu corpo na arcada

Assobiarei aos mares
Vil porco desligado
Abraçarei o vidro – casta de azares
Rótulo demarcado!

Seco, suave, frutuoso… rubi
Forte, encorpado, cheio de leveza,
Esta merda de zurrapa que bebi
Titulo- VINHO DE MESA!...

Ah…

terça-feira, 10 de novembro de 2009

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Caranguejola



- Ah, que me metam entre cobertores,
E não me façam mais nada...
Que a porta do meu quarto fique para sempre fechada,
Que não se abra mesmo para ti se tu lá fores!

Lã vermelha, leito fofo. Tudo bem calafetado...
Nenhum livro, nenhum livro à cabeceira -
Façam apenas com que eu tenha sempre a meu lado
Bolos de ovos e uma garrafa de Madeira.

Não, não estou para mais - não quero mesmo brinquedos.
Pra quê? Até se mos dessem não saberia brincar...
Que querem fazer de mim com este enleios e medos?
Não fui feito pra festas. Larguem-me! Deixem-me sossegar...

Noite sempre plo meu quarto. As cortinas corridas,
E eu aninhado a dormir, bem quentinho - que amor...
Sim: ficar sempre na cama, nunca mexer, criar bolor -
Plo menos era o sossego completo... História! Era a melhor das vidas...

Se me doem os pés e não sei andar direito,
Pra que hei-de teimar em ir para as salas, de Lord?
- Vamos, que a minha vida por uma vez se acorde
Com o meu corpo, e se resigne a não ter jeito...

De que me vale sair, se me constipo logo?
E quem posso eu esperar, com a minha delicadeza?
Deixa-te de ilusões, Mário! Bom edrédon, bom fogo -
E não penses no resto. É já bastante, com franqueza...

Desistamos. A nenhuma parte a minha ânsia me levará.
Pra que hei-de então andar aos tombos, numa inútil correria?
Tenham dó de mim. Co'a breca! Levem-me prà enfermaria! -
Isto é, pra um quarto particular que o meu Pai pagará.

Justo. Um quarto de hospital, higiénico, todo branco, moderno e tranquilo;
Em Paris, é preferível - por causa da legenda...
Daqui a vinte anos a minha literatura talvez se entenda -
E depois estar maluquinho em Paris fica bem, tem certo estilo...

Quanto a ti, meu amor, podes vir às quintas-feiras,
Se quiseres ser gentil, perguntar como eu estou.
Agora, no meu quarto é que tu não entras, mesmo com as melhores maneiras:
Nada a fazer, minha rica. O menino dorme. Tudo o mais acabou.


Mário de Sá Carneiro Paris - novembro 1915

sábado, 10 de outubro de 2009


Vilipendiar o amor
É preciso vilipendiar o amor
Maltratá-lo, espancá-lo,
Enforcar o maldito depois de pisá-lo!

Atá-lo a uma árvore à mercê dos elementos!
Debelar esse gueto de sofrimentos!
Vilipendiar o amor
É preciso castrar esse inquisidor!

Que eu era bem menos infeliz
Quando desceste até mim
E eu desci ao perene jardim
Enlaçando-me à ufana raiz!

Vilipendiar o amor!
É preciso vilipendiar o amor!
Envenená-lo com cicuta
Acabar com esse filho da puta!
Ahh…

Oh mãe
Vê ao estado calamitoso a que cheguei
Logo eu
Que sempre amei e me lambusei
Olho por olho, dente por dente
E acabarei cego, desdentado e demente

Vilipendiar o amor
É preciso amá-lo desmesuradamente!

sábado, 26 de setembro de 2009

Insensatez


A insensatez que você fez
Coração mais sem cuidado
Fez chorar de dor
O seu amor
Um amor tão delicado
Ah, porque você foi fraco assim
Assim tão desalmado
Ah, meu coração que nunca amou
Não merece ser amado

Vai meu coração ouve a razão
Usa só sinceridade
Quem semeia vento, diz a razão
Colhe sempre tempestade
Vai, meu coração pede perdão
Perdão apaixonado
Vai porque quem não
Pede perdão
Não é nunca perdoado
Tom Jobim

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Tédio


Não vivo, mal vegeto, duro apenas,
Vazio dos sentidos porque existo;
Não tenho infelizmente sequer penas
E o meu mal é ser (alheio Cristo)
Nestas horas doridas e serenas
Completamente consciente disto.


Fernando Pessoa

quinta-feira, 10 de setembro de 2009


O relógio anuncia-me
- São três horas da manhã
Que me importa o relógio?
São três horas da manhã!
Não durmo
A mente crepita-me
Afloramentos desviados
Pensamentos alucinados
Tic tac tic tac
Submissão poética
No jugo dos ponteiros
É a métrica, é a métrica
Tic tac tic tac
Já são quatro horas da manhã...
Suores...
Virgens em chamas
Oh magnificas Sereias
Sou o Outro revisitado
Movimento perpétuo
Tic tac tic tac
Prestes a me dar um ataque!
São cinco horas da manhã...seis horas da manhã...
Delírio febril
Tic tac tic tac
Obtuso boémio...a arfar...
Num podre leito, a definhar!
Tic tac tic tac
As paredes ecoam-me
Relógio...
Suplico-lhe em vão
-Tic tac tic tac
Pronuncio da desgraça
Tic tac tic tac
E eu morro
Tic tac tic tac
Em cada segundo que passa
Tic tac tic....tac....v^v^___v^..v__^v.___________________________________________________________________________________________________________________________

domingo, 2 de agosto de 2009

Contrariedades


Eu hoje estou cruel, frenético, exigente;
Nem posso tolerar os livros mais bizarros.
Incrível! Já fumei três maços de cigarros
Consecutivamente.

Dói-me a cabeça. Abafo uns desesperos mudos:
Tanta depravação nos usos, nos costumes!
Amo, insensatamente, os ácidos, os gumes
E os ângulos agudos.

Sentei-me à secretária. Ali defronte mora
Uma infeliz, sem peito, os dois pulmões doentes;
Sofre de faltas de ar, morreram-lhe os parentes
E engoma para fora.

Pobre esqueleto branco entre as nevadas roupas!
Tão lívida! O doutor deixou-a. Mortifica.
Lidando sempre! E deve conta à botica!
Mal ganha para sopas...

O obstáculo estimula, torna-nos perversos;
Agora sinto-me eu cheio de raivas frias,
Por causa dum jornal me rejeitar, há dias,
Um folhetim de versos.

Que mau humor! Rasguei uma epopeia morta
No fundo da gaveta. O que produz o estudo?
Mais uma redacção, das que elogiam tudo,
Me tem fechado a porta.

A crítica segundo o método de Taine
Ignoram-na. Juntei numa fogueira imensa
Muitíssimos papéis inéditos. A Imprensa
Vale um desdém solene.

Com raras excepções, merece-me o epigrama.
Deu meia-noite; e a paz pela calçada abaixo,
Um sol-e-dó. Chovisca. O populacho
Diverte-se na lama.

Eu nunca dediquei poemas às fortunas,
Mas sim, por deferência, a amigos ou a artistas.
Independente! Só por isso os jornalistas
Me negam as colunas.

Receiam que o assinante ingénuo os abandone,
Se forem publicar tais coisas, tais autores.
Arte? Não lhes convém, visto que os seus leitores
Deliram por Zaccone.

Um prosador qualquer desfruta fama honrosa,
Obtém dinheiro, arranja a sua "coterie";
Ea mim, não há questão que mais me contrarie
Do que escrever em prosa.

A adulaçãao repugna aos sentimento finos;
Eu raramente falo aos nossos literatos,
E apuro-me em lançar originais e exactos,
Os meus alexandrinos...

E a tísica? Fechada, e com o ferro aceso!
Ignora que a asfixia a combustão das brasas,
Não foge do estendal que lhe humedece as casas,
E fina-se ao desprezo!

Mantém-se a chá e pão! Antes entrar na cova.
Esvai-se; e todavia, à tarde, fracamente,
Oiço-a cantarolar uma canção plangente
Duma opereta nova!

Perfeitamente. Vou findar sem azedume.
Quem sabe se depois, eu rico e noutros climas,
Conseguirei reler essas antigas rimas,
Impressas em volume?

Nas letras eu conheço um campo de manobras;
Emprega-se a "réclame", a intriga, o anúncio, a "blague",
E esta poesia pede um editor que pague
Todas as minhas obras...

E estou melhor; passou-me a cólera. E a vizinha?
A pobre engomadeira ir-se-á deitar sem ceia?
Vejo-lhe a luz no quarto. Inda trabalha. É feia...
Que mundo! Coitadinha!

Cesário Verde

quarta-feira, 15 de julho de 2009

segunda-feira, 22 de junho de 2009


Outros sobem,
Para colher o doce beijo,
E para mim nada me advém,
Apenas me sobeja o desejo…

Se a vida fosse um sonho,
Ai…era eu que subia!
Triste fado em que me ponho,
E desço a moribunda via…

Outros sobem…
E eu? Porque não o mereço?
Outros sobem…
E eu só desço, só desço…

Ah…sou guardador de portões
Neste perene jardim,
Enquanto outros o sobem até ao fim…

Peço-te amor, desce tu um dia,
E aparta-me desta melancolia,
E por força traz-me enlaçado…
E que quem hoje trepe…suba enganado!

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Dispersão


Vivo numa gruta imensa
Tão vasta, tão fria, tão intensa
Que não lhe encontrei o fim...
Perdi-me dentro de mim!

terça-feira, 12 de maio de 2009

Ma Bohème


Je m'en allais, les poings dans mes poches crevées;
Mon paletot soudain devenait idéal;
J'allais sous le ciel, Muse, et j'étais ton féal;
Oh! là là! que d'amours splendides j'ai rêvées!

Mon unique culotte avait un large trou.
Petit-Poucet rêveur, j'égrenais dans ma course
Des rimes. Mon auberge était à la Grande-Ourse.
Mes étoiles au ciel avaient un doux frou-frou

Et je les écoutais, assis au bord des routes,
Ces bons soirs de septembre où je sentais des gouttes
De rosée à mon front, comme un vin de vigueur;

Où, rimant au milieu des ombres fantastiques,
Comme des lyres, je tirais les élastiques
De mes souliers blessés, un pied près de mon coeur!

Rimbaud

terça-feira, 21 de abril de 2009


Não existe amor
Grito paixão!

Isolamento claustrofóbico
Álcool como tónico

Paixão…
Multidão em solidão…

Espanto
Demónio e santo

Traduz-me o delírio?
Arte?
Ou apenas sofreguidão?

Vertigem
Podridão

Guilhotina
Sopro suspenso

Permanente mitigação
Esta exclusão
Paixão
Amor não!

quinta-feira, 16 de abril de 2009


Se a morte predomina na bravura

Do bronze, pedra, terra e imenso mar,

Pode sobreviver a formosura,

Tendo da flor a força a devastar?

Como pode o aroma do verão

Deter o forte assédio destes dias,

Se portas de aço e duras rochas não

Podem vencer do Tempo a tirania?

Onde ocultar - meditação atroz

-O ouro que o Tempo quer em sua arca?

Que mão pode deter seu pé veloz,

Ou que beleza o Tempo não demarca?

Nenhuma! A menos que este meu amor

Em negra tinta guarde o seu fulgor.
Shakespeare

sábado, 11 de abril de 2009


Inverno glaciar
Toca da bruma
Nevoeiro de espuma

Não sei o que em mim
Calou a virgem ânsia de amar
Oposto inicio do fim

Cansaço?
Todos os dias do ano…
De ser humano!

Assombração
Átomo vadio
Ilusão…
Derrame sombrio!

Ah…

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Poética



De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
De noite ardo.

A oeste a morte
Contra quem vivo
Do sul cativo
O este é meu norte.

Outros que contem
Passo por passo:
Eu morro ontem

Nasço amanhã
Ando onde há espaço:
– Meu tempo é quando.
Vinicius de Moraes

terça-feira, 31 de março de 2009

Bojudo fradalhão de larga venta



Bojudo fradalhão de larga venta,
Abismo imundo de tabaco esturro,
Doutor na asneira, na ciência burro,
Com barba hirsuta, que no peito assenta:


No púlpito um domingo se apresenta;
Pregas nas grades espantoso murro;
E acalmado do povo o grão sussurro
O dique das asneiras arrebenta.


Quatro putas mofavam de seus brados,
Não querendo que gritasse contra as modas
Um pecador dos mais desaforados:


"Não (diz uma) tu padre não me engodas:
Sempre, me hé-de lembrar por meus pecados
A noite, em que me deste nove fodas"!

Bocage

sábado, 21 de março de 2009


A minha alma é como aquela terra inóspita
Rude e bravia
Dilacerada pelos sismos e vulcões
E torrentes sombrias
E de marés que a saturam.
E lá, no mais escondido recanto,
Poluído e nauseabundo, uma flor
Mero átomo absurdo
Que a minha lembrança forjou
Miragem inócua
Delírio obtuso
Perdida às minhas mãos
Que ao pó retornou
E me abraçou e me tocou,
E me ensandeceu…
E me envenenou!

domingo, 15 de março de 2009


Quando eu morrer batam em latas,
Rompam aos saltos e aos pinotes,
Façam estalar no ar chicotes,
Chamem palhaços e acrobatas!
Que o meu caixão vá sobre um burro
Ajaezado à andaluza…
A um morto nada se recusa,
Eu quero por força ir de burro.
Mário de Sá Carneiro

segunda-feira, 9 de março de 2009


Rasguei mais um pouco de mim…
Nos desfiladeiros do confim,
Tudo é rocha, abutres e pó,
Vagueio descalço, faminto e só!

Deslumbro-me em cada miragem…
Renovo a esperança, alio-lhe coragem,
Absorto…avisto a vã realidade,
Baixo os olhos…cerca-me lugubridade…

O que me rodeia é deserto,
Trilho dos incertos, rota da desgraça…
Imenso, colossal fosso aberto,
E eu…um camelo que passa!

quinta-feira, 5 de março de 2009


Alma minha gentil, que te partiste
Tão cedo desta vida descontente,
Repousa lá no Céu eternamente,
E viva eu cá na terra sempre triste.

Se lá no assento etéreo, onde subiste,
Memória desta vida se consente,
Não te esqueças daquele amor ardente
Que já nos olhos meus tão puro viste.

E se vires que pode merecer-te
Alguma cousa a dor que me ficou
Da mágoa, sem remédio, de perder-te,

Roga a Deus, que teus anos encurtou,
Que tão cedo de cá me leve a ver-te,
Quão cedo de meus olhos te levou.

Luís Vaz de Camões

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

O DIA QUE MORRA...


O dia que morra,
Quero ir a sorrir!
O dia que morra,
Deixem-me depressa fugir!

Que haja enfim um dia
Que me sinta contente,
Liberto desta dor que me guia,
Liberto desta força que te sente!

O dia que morra,
Hei-de beber um Porto,
Celebrar…que estou morto,
Que ninguém me socorra!

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009


Nem inferno, nem paraíso,
Nem choro, nem riso,
Quero ir para o purgatório,
Navegar num rio ilusório

Ver aqui e ali almas penadas,
Meus irmãos, auras devastadas!
Saltitar, cair no abismo,
Sofrer um imenso cataclismo!

Abaixo os anéis de Dante,
Que eu quero ser comandante,
De um navio intrépido flamejante,
Ao leme de tudo o que é frustrante!

Yehp yep up la up la…grito tanto!
Só no vazio encontro encanto,
Prisioneiro de um rio sem margem…
Não quero fim para esta viagem!

Yehp la ulá yep ip!

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009


Porque o melhor, enfim,
É não ouvir nem ver...
Passarem sobre mim
E nada me doer!

- Sorrindo interiormente,
Co'as pálpebras cerradas,
Às águas da torrente
Já tão longe passadas.

-Rixas, tumultos, lutas,
Não me fazerem dano...
Alheio às vãs labutas,
Às estações do ano.

Passar o estio, o outono,
A poda, a cava, e a redra,
E eu dormindo um sono
Debaixo duma pedra.

Melhor até se o acaso
O leito me reserva
No prado extenso e raso
Apenas sob a erva

Que Abril copioso ensope...
E, esvelto, a intervalos
Fustigue-me o galope
De bandos de cavalos.

Ou no serrano mato,
A brigas tão propício,
Onde o viver ingrato
Dispõe ao sacrifício

Das vidas, mortes duras
Ruam pelas quebradas,
Com choques de armaduras
E tinidos de espadas...

Ou sob o piso, até,
Infame e vil da rua,
Onde a torva ralé
Irrompe, tumultua,

Se estorce, vocifera,
Selvagem nos conflitos,
Com ímpetos de fera
Nos olhos, saltos, gritos...

Roubos, assassinatos!
Horas jamais tranquilas,
Em brutos pugilatos
Fracturam-se as maxilas...

E eu sob a terra firme,
Compacta, recalcada,
Muito quietinho.A rir-me
De não me doer nada.
Camilo Pessanha

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009


Desterradas horas passo sozinho,
E sou estátua queda envelhecida,
Odor mofo de uma bebida,
Pedra caída no caminho!

Perco as horas, as estações
Sou ao meio
Pelo meio

Vulcões alados…
Estranheza, solidão…
Instantes cruzados
Num aperto de mão!

Ah…coração demente,
Irascível voador
Deixa-me simplesmente…

Desterradas horas passo sozinho
E sou estátua queda envelhecida,
Odor mofo de uma bebida,
Pedra tombada no caminho!

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Poema em linha Recta


Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.
Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um acto ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...
Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,
Arre, estou farto de semideuses!

Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?
Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

Fernando Pessoa

terça-feira, 13 de janeiro de 2009


Amo-te, sim amo-te…
Como o dia que nasce
E a noite que desce…
Respiro, durmo, sonho…
E amo-te…
Porquê?
Acaso sei o que é Deus?
Não…!
Sei que respiro!

domingo, 4 de janeiro de 2009

DO NOT GO GENTLE INTO THAT GOOD NIGHT!


Do not go gentle into that good night,
Old age should burn and rave at close of day;
Rage, rage against the dying of the light.
Though wise men at their end know dark is right,
Because their words had forked no lightning they
Do not go gentle into that good night.
Good men, the last wave by, crying how bright
Their frail deeds might have danced in a green bay,
Rage, rage against the dying of the light.
Wild men who caught and sang the sun in flight,
And learn, too late, they grieved it on its way,
Do not go gentle into that good night.
Grave men, near death, who see with blinding sight
Blind eyes could blaze like meteors and be gay,
Rage, rage against the dying of the light.
And you, my father, there on the sad height,
Curse, bless me now with your fierce tears, I pray.
Do not go gentle into that good night.
Rage, rage against the dying of the light.

Dylan Thomas